Paragem no Sinal Vermelho
Sempre gostei de passear a pé por Lisboa, e não há como andar pelos bairros históricos para percebermos que não é só o que vemos lá fora que é bonito. Caminhar sem destino por Alfama pelas ruas estreitinhas que as viaturas não alcançam, perder-me nas ruas com flores em cada canteiro por onde passo. Observar os azulejos já com as marcas do tempo, mas ainda com cores vivas que reflectem a luz preenchendo o espaço com alegria. Ver a roupa pendurada nos estendais à janela e o convívio entre os vizinhos são elementos que nos confortam e nos fazem estar gratos por podermos passear por ali, por um bairro tradicional, com história, com alma. Há também o Bairro Alto, que durante o dia é um lugar calmo e agradável de percorrer. Ler os escritos urbanos bastante prosaicos e outros desabafos nas paredes também nos faz desacelerar o passo e perder algum tempo a ler com atenção, a rir do humor que decora essas paredes. E se as ruas do Bairro são encantadoras! Parecem tão iguais, mas são tão diferentes. Longe da confusão que num passado não muito distante o caracterizava, o Bairro Alto permanece inabalável na sua alma. É mais do que Caipirinhas XL e pedaços de lima caídos no chão. Há as inúmeras mercearias que são também pontos de convívio para os residentes. A música que vem das janelas abertas e mais altas em cada rua, onde invariavelmente vemos alguém a fumar e a ver quem passa. A curiosidade dos donos dos restaurantes, ainda antes da hora de abertura, que da penumbra olham os transeuntes na rua também é frequente de encontrar. De facto, caminhar pelas ruas actualmente quase desertas do Bairro Alto permite-nos ficar absortos, como que a permitir que os nossos problemas e preocupações nos desocupem a cabeça e caminhem ao nosso lado, em conversa connosco e trabalhando conjuntamente para uma resolução dessas mesmas inquietações.
Nesta fase em que as ruas se tornaram mais vazias é reconfortante passear e reconhecer certos sons, como ouvir as gaivotas que nos fazem sentir como se fôssemos pescadores à deriva e que repente sentissem conforto ao ouvir o seu canto. Como se elas indicassem o caminho de regresso. Mas ao fim do dia tornou-se um som familiar e apaziguador ouvir, das janelas entreabertas o som dos pratos a serem colocados nas mesas. Como se estivéssemos a ser convidados pela família prestes a reunir-se à mesa. E o que é que nos junta mais do que o momento em que nos sentamos para a refeição? Em que conversamos, passamos a travessa ou o cesto do pão uns aos outros, a garrafa, mas nunca o sal. Sentimos muito a falta desse convívio nos tempos que correm, o que me remete imediatamente para um sítio que gosto e onde sinto que o ambiente é familiar. Não nos podemos reunir à volta da mesa, é um facto. Mas e se um dos sítios que eu mais gosto me levar a refeição a casa e me permitir sentir um pouco dessa familiaridade que deixa saudades e nos mima o paladar? Falo-vos do restaurante Sinal Vermelho, na Rua das Gáveas. Decoração clara e leve. Comida deliciosa. Bom atendimento e bom preço. Pensam que isso mudou em tempos de confinamento? Digo-vos já que não. A experiência familiar começa logo quando ligamos para fazer a nossa encomenda: a simpatia da senhora que nos atende o telefone é encantadora, como se nos conhecêssemos há muito. E o resultado? Queremos pedir tudo. Há dias quis uma refeição do Sinal Vermelho. Só para mim, acabei por pedir entrada, pastéis de bacalhau com grelos salteados, depois o pregado à lagareiro e com batata a murro e repolho e, por fim, o vulcão de chocolate com caramelo salgado. Pensam que foi fácil? Foi, mais ainda do que eu esperava. E a entrega ao domicílio foi bem rápida. Fiquei bem cheia? Comi mais do que queria? Sim. Como não? Asseguro-vos que estava delicioso. Foram esses os pratos de eleição da minha última encomenda. Mas garanto-vos que já conheço o pianinho, as pataniscas com arroz de tomate ou arroz de feijão, os peixinhos da horta, os filetes de polvo. E sobremesas? O brownie é indecoroso de tão bom. Mas não deixem de lado o cheesecake de manga nem o bolo de bolacha.
Consegui abrir o apetite ao leitor? Espero que sim. Porque vale mesmo a pena. A repetir em breve.
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