Lucrécia caminha pela cidade: encontro com o açái
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Par contre,
como diriam os franceses, sempre adorei caminhar. No campo, na praia, na
cidade, no país ou no estrangeiro, em qualquer estação do ano, podem contar
comigo para dispensar o motorista da carris e ir pela estrada fora em modo
pedestre. Sozinha ou acompanhada. No primeiro caso, atenta ao sol sob as folhas
das árvores, às múltiplas tonalidades de verde que estas conseguem ter, a
sentir vento contra o rosto ou as pequenas gotas de chuva a caírem-me na
cabeça, refrescando-me as ideias. Ou a levar uma valente molha, sem me mostrar
contrariada. No segundo, em conversas sem fim, trocando ideias, estados de
almas e gargalhadas (conforme o dia) com quem me acompanha. Por regra, não
tenho rota pré-definida. Deixo a vida me levar, como cantam os Skank.
Este
fim-de-semana, soube-me particularmente bem caminhar pela cidade. Porque
estamos com a vida muito limitada, porque o tempo estava convidativo e porque
notícias de Londres recordam-nos que caminhar pela cidade é ainda um risco acrescido quando se é mulher. E, no entanto, um bom passeio urbano, de dia ou de noite,
tem tanto de simples, como de libertador.
Em
Flâneuse – Women Walk in the City in Paris, New York, Tokyo, Venice and London, Lauren Elkin parte da premissa
de que as ruas foram sempre um território tendencialmente masculino. Por regra, eram os homens quem saía livremente para ir trabalhar, mas também para ir aos cafés, aos
clubes ou percorrer a cidade sem destino prévio. Claro que esta reclusão protectiva incidia sobretudo nas mulheres de classes sociais mais elevadas que apenas saíam acompanhadas quanto mais não seja de uma mulher mais velha, criada, dama de companhia ou solteirona de serviço que lhes assegurasse a virtude e, por essa via, a segurança. As mulheres pobres, incluindo as escravas, circulavam pelas ruas numa liberdade semeada de perigos. Elkin, uma americana
apaixonada por Paris, narra a vida de mulheres que contrariaram esta hegemonia
masculina, cruzando as suas histórias, com o passado e a geografia das cidades
onde viveram. Entre as escolhidas estão Virginia Woolf, Joan Didion e Agnès
Varda.
Lisboa
não está neste mapa, mas devia, até porque quem por aqui caminhava nunca corria o
risco de ficar com a barriga a dar horas. Na sua História Gastronómica de Lisboa, Manuel Paquete traça o retrato de
uma cidade cosmopolita, onde o que hoje chamamos street food existiu desde cedo e sempre com uma certa variedade de escolha. Mesmo
antes dos Descobrimentos trazerem novos sabores, a cozinha de Lisboa assentava
já sobre as tradições cristã, árabe e judaica, com a inerente variedade de
opções.
Hoje,
Lisboa mantém-se aberta ao mundo e isso tem reflexos também na gastronomia. O
copo que serve de ilustração a estas palavras tem banana, morango, granola e
açaí gelado. Como já devem saber, o dito açaí é um fruto brasileiro conhecido pelas suas propriedades anti-oxidantes
e que sabe maravilhosamente. Não sei se este que experimentei é o melhor do mundo, mas era
seguramente muito bom. Não tinha planeado comer açaí, aliás, a vontade só
surgiu depois de me ter apercebido do tamanho gigantesco do pastel de vento de
banana e canela (mas eu vou-me a ele, acreditem). Iguarias brasileiras, à mão
de semear. Fazem-me sentir orgulhosa de viver numa cidade onde há espaço para
todos e feliz por em vez de ir ao ginásio continuar a andarilhar pelas ruas de
Lisboa.
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